quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

Melhores livros de 2016

Costumava anotar aqui no blog os "melhores" do ano, mas conforme desanimei de escrever, deixei isso de lado. No entanto, 2016 foi um ano bem produtivo, então não é má ideia compartilhar aqui o que eu li. Se não interessar a mais ninguém, serve pelo menos como registro.


Aquele que escreve para os tolos pode ter certeza de sempre ter grande audiência.
 

 Aforismos para a Sabedoria de Vida, de Arthur Schopenhauer

Schopenhauer é o go to guy para quem quer conhecer o “lado negro” da Filosofia. Geralmente ele é criticado por ser extremamente pessimista, e não apenas por ser um carinha meio deprê, mas por realmente sistematizar toda a nossa experiência de mundo da forma mais triste e carente de significado o possível.
Partindo dessa introdução, parece surpreendente esperar que o cara tenha escrito um livro para a ajudar as pessoas a serem mais felizes, mas fez justamente isso, e muito bem. O livro é parte de uma obra maior (Parerga e Paralipomena), mas costuma ser lido separadamente, e mostra que Schopenhauer, embora bastante depressivo no seu trabalho filosófico, consegue ver com clareza a forma mais prática de se viver, não para encontrar a felicidade, o que ele considera absurdo, mas para evitar a dor e o tédio, o que, para ele, é o melhor que podemos almejar.




Se você busca a verdade, então a vida examinada vai apenas te levar até os limites da solidão e te deixar no acostamento, com sua verdade e nada mais.


The Conspiracy Against the Human Race, de Thomas Ligotti

Chamar o que o Ligotti faz de Filosofia é forçar a barra, já que o livro em si é uma obra de arte que visa chocar. No entanto, o cara realmente vai fundo na filosofia, buscando as visões pessimistas de vários pensadores. É o livro ideal para quem leu Schopenhauer e achou o cara muito otimista. Também é perfeito para quem assistiu True Detective e se sentiu atraído pela Filosofia do Rustin Cohle, interpretado por Matthew McConaughey. Por fim, é o livro para todo mundo que já olhou à sua volta e percebeu um mundo hostil, e depois olhou para dentro de si, e viu algo ainda pior.



Entre pele e pele, há apenas luz.



The Magus, de John Fowles

Foi o primeiro livro de John Fowles que eu li (antes de The French Lieutenant’s Woman) e me deixou uma forte impressão. O livro é LONGO e cansativo, mas a estética é incrível: mais de uma vez li e reli trechos e páginas inteiras apenas pelo prazer estético de um bom dialogo ou descrição.
Basicamente, é a história de um jovem professor Inglês que vai trabalhar em uma escola numa ilha grega, e lá conhece o “magus” do título, um velho milionário com muitos mistérios, e acaba se envolvendo com uma bela e ainda mais misteriosa jovem que vive com ele. Mas nesse livro nada é o que parece, e as camadas de mentiras e mistérios vão aos poucos se revelando.
É com certeza um livro confuso, mas vale muito o esforço para que seja lido, e relido.



Filhos de Maomé, se animem, pois amanhã teremos tantos cristãos em nossas mãos que os venderemos, dois escravos por um ducado, e teremos tantas riquezas que seremos todos de ouro, e das barbas dos gregos faremos coleiras para nossos cães, e suas famílias serão nossos escravos. 


1453, de Roger Crowley

Nunca se deram ao trabalho de me explicar, na escola, o que foi o Império Bizantino. Só depois de terminar minha segunda faculdade (!) é que eu decidi estudar a história do Cristianismo com afinco, e me deparei com esse enorme império, invisível em todos os meus anos escolares. Mas o conheci primeiro pelo seu triste fim: a queda de Constantinopla e seu subseqüente saque pelos turcos Otomanos. Os mesmo Otomanos que por séculos aterrorizaram cristãos pela Europa e Oriente Médio, antes e depois da queda da última capital romana, e que genocidaram quase toda a população grega de um antes grande e admirável império. O livro narra justamente esses últimos momentos de Constantinopla durante o cerco de 1453.
O autor faz o trabalho de historiador com esmero, não mostrando preferências nem julgamentos de valores, sempre fazendo o possível para mostrar diferentes perspectivas e pontos de vista. Isso pode fazer com que um turco hoje leia o livro e sinta orgulho de sua história, mas para um cristão, o livro serve como uma elegia e um alerta. Até para quem não é cristão ou muçulmano, o livro fornece ferramentas úteis, mesmo para entender as relações geopolíticas do mundo atual. Ajuda a explicar, por exemplo, a antipatia e mesmo hostilidade entre Rússia e Turquia (mesmo antes do recente assassinato do embaixador russo em Ankara). Ou seja, é realmente um livro valioso, independentemente de suas opiniões pessoais.


Acreditamos que inventamos símbolos. Na verdade, eles nos inventam; nós somos suas criaturas, formadas por suas mãos.


 Shadow and Claw, de Geene Wolfe

O livro é na verdade a junção das duas primeiras obras da “saga” The Book of the New Sun: The Shadow of the Torturer e The Claw of the Conciliator. Narra a história do jovem Severian, um aprendiz da Guilda dos Torturadores, que acaba se envolvendo em um conflito político e é expulso da guilda, e suas subseqüentes viagens e encontros com diversos personagens. No meio do caminho, Geene Wolfe aproveita para discutir diversas questões filosóficas, éticas, morais e religiosas, mas sem cansar ninguém: são migalhas de intelectualidade num livro cheio de aventura e mistério para agradar o nerd padrão.
Outro bônus é que Geene exibe na sua obra sua admiração pela religião Cristã (que ele conhece através do Catolicismo), que fica evidente para quem conhece mesmo só um pouco de teologia, e é um presente a mais para quem se aventura em sua obra. Esse livro, e os demais da coleção, são o melhor que a fantasia gerou, provavelmente desde Tolkien, e serve de alívio para quem tinha que se contentar com o bom-mas-nem-tanto mundo imaginário de G. R. R. Martin.


Deus é supremamente bom porque ele supremamente É.



Confissões, de Santo Agostinho de Hipônia

Este é um livro para ler, reler, e reler de novo, várias vezes durante a vida. Santo Agostinho foi um Santo e Doutro da Igreja, e seus escritos foram por séculos a principal base teológica da Igreja, tanto Ocidental quanto Oriental. Até São Tomás, Agostinho era autoridade máxima, e hoje continua essencial para quem quer entender teologia. Além disso, ele foi Filósofo e um grande psicólogo: esta é a primeira auto-biografia que se tem notícia, e o primeiro livro a adentrar os segredos da mente e buscar entender porque pensamos e fazemos coisas de uma determinada maneira e não de outra.
O livro é ainda a história da conversão do santo, mostrando suas interações com o Evangelho desde a infância, através de sua mãe cristã, Mônica, sua passagem pelo Dualismo, até conhecer, em Roma, Santo Ambrósio, que o convenceu da verdade das Escrituras. É uma história de uma vida de pecado que se arrepende e se torna alva como a neve, e ascende a Deus. É basicamente o que todo cristão busca, e é sempre bom saber que alguém alcançou as alturas, e que todos nós também podemos.